CAPÍTULO XII - “O SUBVERSIVO DE PAULO AFONSO”

[CAPÍTULO XII - “O SUBVERSIVO DE PAULO AFONSO”]

Em paráfrases aos autos expressos da História ditatorial, no tocante à distribuição de renda, li e entendi e repasso que os estragos feitos pelos militares e seus tecnocratas foram perniciosos para a maioria da população brasileira. No ocaso do regime de exceção, os 20% mais ricos ficaram com quase 70% da riqueza do Brasil, enquanto, antes do golpe de 1964, embolsaram 55%. Neste paradigma tendencioso, a má “divisão do bolo” acabou tendo influência direta na parca renda do trabalhador com pior renumeração. Antes da ditadura, quem recebia um salário mínimo necessitava trabalhar pouco mais de 98 horas/mês para comprar sua cesta básica. Em 1983, eram precisos mais de 172 horas. O disparate era gritante.

Jarbas Passarinho, o “americanizado”, ex-ministro de Costa e Silva, reconheceu a corrosão do piso salarial brasileiro durante os governos militares, mesmo assim ainda enfatizou a importância do rápido e suposto crescimento econômico. Disse: “temos hoje a pior distribuição de renda do mundo, e, de fato, o salário mínimo poderia ser bem maior”, observou. Contudo é preciso levar em conta outras considerações: o Paraguai, é fato, tem salário mínimo maior do que o nosso. É mais rico por isso? Ratificou, com isto, a máxima de que o país era rico e o povo ficou pobre, justificando a incongruência com esta comparação estapafúrdia entre o “primo rico e o primo pobre”, no caso Brasil/Paraguai daquela época.

Mas, conforme sugeri no capítulo anterior, reverberando-me nos noticiários de então e na minha aflita experiência por ter sido flagelado por alguns dos vários métodos científicos de torturas dos opressores, como o famigerado pau-de-arara, cadeira do dragão, choques elétricos, telefone, afogamento na calda da verdade, afogamento com capuz, mamadeira de subversivo, soro da verdade, massagem, geladeira e outros métodos psíquicos, dos quais discorrerei com detalhes no livro em projeção.

“Para que se desenvolvessem métodos tão sofisticados de tortura, praticados com grandes requintes de sadismo, era preciso que o governo militar espraiasse a propaganda do culpado, cada torturado era um facínora, era o terrível comunista que assaltava bancos, o terrorista que comia criancinhas, que ameaçava a família, assim, era criado o preconceito contra os torturados, que eram culpados e merecedores de todos os suplícios que lhe eram impostos em uma sala de torturas. Os recrutados para exercer a tortura eram indivíduos que recebiam favorecimentos dos seus superiores, gratificações e reconhecimentos de heróis, pois ajudavam a livrar o país dos terroristas comunistas. Geralmente eram pessoas intimamente agressivas, às vezes com desvios de personalidades, que legitimavam suas atrocidades sem limites e se tornavam incapazes de ter sentimentos por quem torturava”.

Se por um lado a tortura coibia, causava medo e terror em quem se deixava apanhar e, principalmente, em quem estava livre, militando clandestinamente, por outro lado causava um grande problema, como esconder os torturados mortos? O que fazer com os corpos, uma vez que o regime militar negava veementemente a existência desta prática horripilante nos seus calabouços? Para camuflar este problema, médicos legistas passaram a fornecer laudos falsos que escondiam as marcas das torturas, justificando as mortes das vítimas como sendo de causas naturais. Muitos dos mortos tinham nos laudos o suicídio como causa mais comum, vários foram os “suicidas” da ditadura. Outras causas que ocultavam as reais nos laudos eram as dissimulações de atropelamentos, acidentes automobilísticos ou que tinham sido mortos em tiroteios com a polícia. Vários legistas foram notórios.

Continuaremos nos próximos capítulos...